sábado, 17 de junho de 2017

"Curtindo a Vida Adoidado" - quando a tradução atrapalha a mensagem

Quem nasceu entre 1970 e 1980 com certeza assistiu esse filme pelo menos uma vez na Sessão da Tarde da TV Globo. Ou assistiu todas as reprises até decorar as cenas, como alguns amigos meus fizeram, usando o filme como uma inspiração para a vida que sonhavam ter (e que a maioria não teve). Acho que muita gente que procurou se inspirar no Ferris Bueller aqui no Brasil não deve ter entendido a mensagem dele por culpa da tradução totalmente sem sentido do título do filme.

Salve Ferris!

Embora sendo apenas mais um dos trocentos filmes americanos de adolescentes na escola (que eram moda nos anos 80), esse é sem dúvida o mais lembrado desse gênero por quem é da minha geração. O filme conta um dia na vida do adolescente Ferris, que resolve recorrer a um expediente bem comum para muita gente, fingir estar doente para faltar à escola ou ao trabalho. Só que o jovem Ferris não só tira o dia para si, como aproveita muito bem aquele dia com sua namoradinha Sloane e ainda consegue convencer seu cunhado depressivo, Cameron, a ir junto.

Curtir a vida também é ir ao museu!

Eu não sei qual seria a melhor tradução para o título "Ferris Bueller's Day Off", mas acredito que a versão brasileira foi uma das piores possíveis. Claro que tem a questão do apelo comercial, de ter que ser um título fácil de ser entendido, mas na minha opinião o título dado aqui comprometeu seriamente a mensagem de Ferris para os nossos adolescentes da geração X.

A tradução portuguesa, apesar de ainda não ser fiel, ficou menos pior

Com o nome recebido no Brasil, o filme acaba passando uma ideia de que o legal é ser o famoso "porra louca", que larga tudo em nome de sair curtindo a vida de maneira inconsequente. Na minha opinião não é isso que Ferris quer transmitir quando aparece no filme quebrando a quarta parede e dizendo diretamente para o público que "a vida passa muito depressa, se não parar para curti-la de vez em quando, ela passa e você nem vê". 

O que ele diz ali é que você pode continuar fazendo suas coisas, estudando, trabalhando, só não pode se deixar engolir pelo sistema como a maioria faz. O que você precisa — e é isso que Ferris explica e demonstra — é usar de uma certa malandragem para driblar as amarras do sistema e assim conseguir suas pausas para curtir a vida.

Ferris é um malandro, e como bom malandro ele dá sempre um jeito de tornar as coisas mais fáceis e muito mais divertidas, fazendo tudo com muito charme, tanto que na escola todos gostam dele, a ponto de sempre ter um "Salve, Ferris" dito ou escrito em algum lugar. E como bom malandro, tem muita ousadia e cara de pau para conseguir subir num carro alegórico no meio de um desfile onde ninguém o conhece e cantar (ou dublar) Twist and Shout.

Só nos filmes que todo mundo sabe a coreografia sem precisar ensaiar

Em um mundo onde as pessoas estão se tornando todas workaholics, é preciso aprender com os malandros como Ferris Bueller a viver com mais leveza, a desapegar das obrigações do trabalho para poder viver a vida antes que ela passe por nós e a gente nem veja de tão ocupado que está. Você é muito mais do que seu trabalho e suas obrigações.

Agora, se você estava até hoje achando que o o filme dizia para largar tudo e sair por aí curtindo a vida adoidado, sugiro que assista de novo e preste atenção no que o Ferris realmente quis dizer com fazer pausas (day offs) para não deixar a vida passar sem ser percebida. ;)

Curta com parcimônia

Tem um detalhe nesse filme que eu não sei se você ou se alguém reparou: Ferris consegue fazer tudo isso sem beber uma gota de álcool! Ferris é mesmo o cara!

Malandro é malandro, mané é mané!

Não que eu não beba, não que eu tenha moralismos com álcool ou mesmo com outras drogas. Eu só acho que curtir a vida não é sinônimo de encher a cara como pregam tantas músicas do atual cancioneiro popular e nem precisa ficar doidão a ponto de não lembrar de manhã o que fez na noite anterior. Pra curtir de verdade tem que ter moderação. Afinal, como diz Mainha, tudo demais é veneno.

Salve, Mainha!

Elinaudo Barbosa

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